sábado, 16 de julho de 2016

Beco sem saída

Pés gelados e You La Tengo tocando no rádio antigo do quarto. Uma cortina feia e amarelada encarava-me. De pés gelados encosto na pele das coxas dele só para ganhar aquele sorriso de menino bobo brincalhão. Today is the day me faz dos pés até as coxas do menino brincalhão que, conheci num descuido da alma pesada. Me deixou em paz, me deixou quietinha. Me fez um café e uma cara feia. Cantarolou Today is the day como se não houvessem preocupações com os limites e perigos. Como se o dia só desse partida de meio dia em diante. Depois de esquentar os pés com afagos e suspiros.
Bebericando café preto, sem açúcar, resistente a insistência do leite leitissímo. A marca preferida entre todas as outras superficialidades da cidade grande e da podre industria alimentícia. Domingo! Não havia som de carro, não havia buzinas, conversas apressadas, despertadores ou preocupações com as contas que vivem em atraso e o cão que ladra dentro do peito. Não havia nada e o nada se fez tudo em sua plenitude de não ditos e gestos de carinho.
Era uma caminhada na rua de prédios demolidos, fazendo esquina com o samba que me faz transbordar de vida, bandeirolas fora de época. Arte sem dono. Mãos dadas, dedos entrelaçados e a estranheza da jovem amarga. O carinho não esperado e sem repeteco. Um par de jarro com flores mortas sentados no banco da praça. Ouvindo e vendo não sei o quê. Talvez, ouvindo e vendo o nada que se forma dentro da casca e todos os laços bem dado para que nada saia do lugar. Para que o peito aguente os trancos e barrancos de mais uma dezena de mudanças, carregando a chama acesa da vela para outras casas, deixando assim o escuro para a reflexão de tantos outros. Era o par de jarro com flores mortas, tentando encontrar uma forma rápida e indolor de sair da casa com a chama da vela ainda viva.
Pés reavivados caminham de volta pelos mesmos desejos. Caminhada arrastada, arrastando a vontade de não mais ir e só ficar. Ficar sem se importar se a morte vos espera na boca da satisfação do desejo e da união. Caminhada arrastada até os três degraus do prédio demolido, contornados com destreza, o corpo inclinado para um lado, um abraço, um beijo, um afago.
O contrato fora assinado. Sem meia volta, sem volta e meia. O contrato da busca itinerante pela satisfação do desejo. Mas, existe a coragem de sentir e externar repulsa por essa morte. 
Preferiu viver em vontades ao invés de sepultar os próprios desejos.

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