Eu
vejo o muito. Vejo o desespero nos olhos dos jovens e a insegurança
nos sorrisos dos mesmos. Eu vejo a candura nos olhos das nossas
crianças e vejo o cansaço nos olhos de mainha. Eu vejo o muito e o
que mais vejo é a dor. A dor nos olhos daquele rapaz que conheço há
alguns poucos anos, mas que nunca me prontifiquei para falar sobre a
tal dor. Quase nunca nos vemos e quando nos encontramos não queremos
falar sobre a dor que nos fere e nos caleja. Eu vejo o amor das
nossas mães e todo o cuidado amornado dentro das broncas e dos risos disfarçado. Eu vejo a simplicidade e a delicadeza dos
pequenos gestos de bem-querer, quando passo por um par de idosos
voltando da feira. Eu vejo a garra das mulheres das esquinas e a
ressequidão em seus olhos. Eu vejo a dor. E eu sinto a dor. Eu vejo
o tanto que a moça dos olhos de coruja têm a me dizer, por querer
me proteger de um roteiro que ela bem conhece. Também vejo sua
dificuldade em dizer-me tais coisas em frases carinhosas,
revelando-me tudo em forma de dureza e culpa. Eu vejo a culpa. Eu
vejo a culpa e a dor nos ombros das moças que me cercam. Eu as vejo.
Eu as sinto. Eu vejo a culpa da moça que não soube amar, por não
ter oportunidade de encaixar-se em um corpo abrigo. Eu vejo a dor que
ela carrega estampada no braço esquerdo. Eu vejo os sem pares. Eu
vejo a dor e a solidão que esses carregam. Eu sinto. Eu vejo os
perigos nos sulcos da face daquele homem. Eu vejo sua solidão, seu
escárnio e seu prazer em ferir com o mesmo ferro que foi ferido. Eu
vejo e eu tento não o sentir, mas o sinto. Eu vejo o medo do
abandono talhado nos olhos daquele rapaz e sua insegurança espalhada
em cada dente daquele falso sorriso. Eu vejo a criança trancafiada
dentro daquele outro rapaz e toda a sua necessidade em ser vista. Eu
vejo a dor da moça que só pancadas levou. Eu a sinto. Não queria,
mas a sinto. Eu vejo o seu zelo em transformar dor e amargura em algo
que floresça e não em algo que rasteje, como bem faço. Eu vejo seu
cansaço cotidiano e seus forçados sorrisos para convencer a si que
desistir não é uma opção. Eu vejo o início do ciclo da vida em
minha tia, agora também avó, e sinto que apesar do ontem, ainda
existe algo esperando por ser cultivado. Eu a vejo, eu a escuto
ninando sua pepita de ouro e as sinto.
Eu
vejo o muito, sinto o mundo e sou cada um dos que sinto e vejo. Mas,
sinto. E só.
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